De onde vem o hábito humano de fofocar?
Não espalha, tá? E, se
alguém perguntar, nunca diga que fui eu que contei. Mas fofocar é um
comportamento peculiar e íntimo, e isso dificulta muito saber de onde surgiu
esse hábito tão comum entre os humanos.
As histórias sobre as possíveis
origens da fofoca são interessantes porque se entrelaçam com a nossa própria
evolução: como aprendemos a cooperar e nos tornamos mais sociáveis.
Explicando de maneira simples, a
fofoca é uma ferramenta social que usamos para discutir as idas e vindas
cotidianas das pessoas que nos cercam.
É verdade que muitas vezes, trata-se de
algo malicioso. Mas, para cientistas, é também uma coisa positiva, uma espécie
de “argamassa” que une um grupo social.
Cérebro maior
Para
a fofoca ter surgido, primeiramente precisamos de uma forma básica de
linguagem. A origem desta também é difícil de pontuar, já que ela não deixa fóssil.
Nosso ancestral comum com os primatas
seria uma espécie mais rudimentar, com um cérebro limitado, o que significa que
eles se comunicavam com grunhidos e vocalizações semelhantes aos dos atuais
chimpanzés.
Novas pesquisas, no entanto, revelam
que a comunicação entre símios é mais sofisticada do que se pensava. Chimpanzés
integrados a um grupo que já vivia no zoológico de Edimburgo, na Escócia,
rapidamente aprenderam vocalizações com novos significados, como “maçã”, por
exemplo.
Segundo Katie Slocombe, da
Universidade de York, na Grã-Bretanha, essas vocalizações contêm informações
importantes e nos dão pistas de como a linguagem humana evoluiu.
Além de desenvolver habilidades
linguísticas, nossos ancestrais também tiveram que desenvolver um cérebro
maior, necessário para imaginar, processar e articular as informações sobre
nosso entorno.
O Homo erectus surgiu há 1,8
milhões de anos e tinha um cérebro bem maior que seus antepassados. Ele foi o
primeiro humanoide a deixar a África e colonizar partes da Europa e da Ásia.
Seu cérebro passou a permitir a
organização de sociedades cada vez mais complexas, o que conduziu à evolução de
uma linguagem mais complexa.
Compartilhando conhecimento
Mas
há outros componentes nessa história, porque os primeiros humanos também
precisavam de outras habilidades para sobreviver.
Para dominar a caça e a colheita, eles
precisavam aprender a cooperar. E a maneira mais eficiente de fazer isso é
compartilhando informações sobre o papel de cada indivíduo. Ou seja, fofocar
sobre os outros.
Essa é a teoria defendida por Klaus
Zuberbuehler, da Universidade de St. Andrews, na Grã-Bretanha. “Conforme nossos
ancestrais foram deixando as florestas para as áreas de savana, mais abertas,
aumentou a necessidade de trabalharem juntos para conseguirem caçar com
sucesso. Isso forjou um alto grau de trabalho em equipe e compartilhamento de
informações pessoais”, explica.
Essa vontade de partilhar informações
pode ser notada nas crianças de hoje. Desde muito cedo, elas destacam fatos de
suas vidas e de suas famílias e amigos.
“Foi esse aspecto social e de apoio,
típico da natureza humana, que permitiu que a fofoca surgisse”, afirma
Zuberbuehler.
Para ele, a fofoca não surgiu entre
nossos ancestrais como uma extensão da necessidade de aliciar um ao outro. O
cientista aponta para evidências de que o ser humano é capaz de “se unir
intencionalmente”, dividindo informações para chegar a um objetivo comum,
muitas vezes de longo prazo, enquanto símios tendem a cooperar apenas para
atender a suas necessidades imediatas e individuais.
Em torno da fogueira
Mas
como qualquer boa história, esta aqui também tem uma reviravolta surpreendente.
Isso porque outra teoria começou a
ganhar força: a de que a fofoca evoluiu como consequência da capacidade do
homem de controlar o fogo.
Entenda: durante o dia, os primeiros
humanos passavam boa parte do tempo tentando se manter vivos, procurando comida
e abrigo enquanto tentavam escapar de predadores. De noite, só lhes restava
dormir.
Mas ao aprender a fazer fogo, talvez
há cerca de 1 milhão de anos, o homem transformou as horas de escuridão. Mais
aquecidos e seguros em torno de uma fogueira, os humanoides tiveram a
oportunidade de se comunicar de maneira mais livre e sobre assuntos menos
sérios.
Alguns estudos recentes sustentam essa
ideia, mostrando que as conversas em tribos de hoje mudam do dia para a noite.
Por exemplo, de dia, os Kalahari, que vivem no deserto de Botsuana, falam sobre
assuntos práticos. De noite, conversam de maneira diferente e adoram contar e
ouvir histórias.
E uma boa história é sempre base para
uma boa fofoca.
O DNA da fofoca?
Mas determinar a origem exata da
fofoca pode ser uma tarefa árdua, já que se trata de algo de natureza efêmera.
Alguns indícios podem surgir conforme estudamos mais o DNA de nossos
ancestrais.
Cientistas já sequenciaram o genoma do
homem de Neandertal e o de seus parentes mais próximo, o hominídeo de Denisova.
E reconhecem que os neandertais possuem uma versão de um gene essencial para a
fala, que nós também temos.
Mas até conseguirmos provar algo
concretamente, a origem da fofoca será algo como a própria fofoca: uma mistura
de fatos e especulações.
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